quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

História - Parte V - A bandagem da artéria pulmonar

A cirurgia estava marcada para o dia 23/12/08 às 10:00 da manhã. No dia anterior conversamos com o cardiologista que nos explicou como seria a cirurgia, a previsão de recuperação, o prognóstico e nos aconselhou a não vir no horário marcado pois as cirurgias costumam demorar a começar e esperaríamos em vão, só poderíamos vê-la quando a levassem de volta à UTINeonatal. Combinamos então que chegaríamos no horário da visita. Claro que passamos uma péssima noite e uma manhã pior ainda, esperando a hora de ir para o hospital e ter notícias. Quando lá chegamos soubemos que a cirurgia havia terminado a pouco, Valentina já estava sendo levada para a UTINeo e que deveríamos aguardar para vê-la. O cirurgião veio conversar conosco e disse que tudo havia corrido dentro do esperado, agora tudo dependia exclusivamente dela. Foi muito difícil ver Valentina entubada, cortada, inconsciente. Conversamos um pouquinho com ela e já era hora de ir embora. Achamos estranho que seu braço estava muito inchado, mas estava envolto em uma bandagem, nos explicaram que era por causa da cirurgia e que logo ficaria bom. Voltamos na parte da tarde e ela continuava entubada, se recuperando da cirurgia. Fomos embora com o coração apertado. Pedi a Deus, naquela noite, que permitisse sua extubação e, na manhã seguinte, vi que Ele havia me atendido. Ao chegarmos ao hospital a vimos extubada porém extremamente agitada, foi-nos explicado que era uma reação normal à cirurgia, seus batimentos estavam altos, foi dada a medicação contra a dor e ela ficou mais calma. Na parte da tarde continuou do mesmo jeito, dormindo, medicada, porém com os parâmetros muito elevados. Como era véspera de Natal íamos para a casa dos tios do Júnior confraternizar com a família. Enquanto nos arrumávamos meu coração pedia notícias. Ligamos e soubemos que ela havia sido reentubada. Logo após sairmos teve uma convulsão, devido ao esforço para respirar, pois não sabíamos, nem os médicos, que com a cirurgia ela havia tido uma atelectasia do pulmão esquerdo, que é quando o pulmão meio que murcha e não volta à sua posição normal, precisando ser reexpandido. A manhã de Natal foi péssima, chegamos ao hospital e as notícias eram muito ruins, era necessário dar tempo para Valentina se recuperar. Os dias seguintes foram de muita angústia pois a impressão que tínhamos era que nada havia mudado, mas dia a dia a sedação diminuía, os parâmetros do ventilador também e, após uma semana ela foi extubada novamente, desta vez com sucesso. No entanto Valentina pegou uma infecção no corte da cirurgia e o que era para ser um cortezinho comum estava uma pereba horrorosa. Seu quadro foi se agravando, ela precisando de mais e mais drogas até que um dia descobrimos que, além da infecção por bactéria, ela também havia desenvolvido uma infecção por fungo e esta é que é a danada! Antes mesmo da cultura dar positiva para o fungo, pela experiência da equipe médica, já começaram a dar o antifúngico e nós alí, olhando a nossa pequenininha indo embora, devagarzinho, devagarzinho. Tivemos uma conversa entre mãe e filha um dia, muito dolorosa para mim, mas necessária também. Eu sei que às vezes seguramos as pessoas aqui neste plano, não queremos deixá-las ir, não por egoísmo, mas por amor. Mas foi por amor também que disse a ela que se fosse sua hora que fosse pois eu não suportava mais vê-la sofrer tanto daquela forma, sendo invadida, machucada, manipulada, picada. Nesta fase já estávamos perdendo nossas esperanças pois Valentina estava com septicemia, que é muito difícil de ser revertido. Mas o nosso tempo não é o tempo de Deus.

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Mais uma internação...

É estranho como, em questão de horas, a vida da gente faz um desvio e tudo se bagunça novamente. Eu, achando que a vida estava voltando ao normal, tive a infeliz surpresa de constatar mais uma vez quão frágil é nossa vida. Havia trabalhado somente um dia quando tivemos que internar Valentina novamente. Ela apresentou uma gripe muito forte, voltou para o oxigênio, entramos com medicação, noites sem dormir com dificuldade para respirar, conosco fazendo nebulizações constantes para melhorar a função pulmonar até que chamamos a dra Renata para uma nova avaliação, pois percebemos a piora no quadro, e ela sugeriu irmos para o hospital. Disse que provavelmente seria uma internação de dois ou tres dias, para fazer exames. A UTI móvel veio nos buscar e voltamos ao Santa Lúcia. Antes de sair de casa eu já havia ligado para o hospital, falado com a médica de plantão e confirmado a vaga na UTI. Ao chegarmos lá a médica do SOS já nos encaminhou para a UTI onde foi feita a admissão, coleta de exames de sangue e os procedimentos iniciais. Quando fomos vê-la estava muito chorosa, magoada com tudo que foi feito. Tanto tempo em casa recebendo somente amor e carinho... Foi marcado um raio X do pulmão, uma ecografia do abdômen, pois a doutora ficou preocupada com o tamanho do fígado, e um ecocardiograma. Como foi difícil voltar... Tantos sentimentos, tanta preocupação. Mas colocamos a nossa vontade de ficar em casa de lado e pensamos no melhor para a Valentina, que naquele momento era estar de volta ao hospital, com cuidados constantes, fisioterapia tres vezes ao dia, presença de médicos, enfermeiros, técnicos, toda a antiga rotina. Dormi com ela nesta primeira noite, ou melhor, tentamos dormir pois ela estava muito incomodada e não conseguia dormir por muito tempo. A nebulização passou a ser feita de tres em tres horas, a medicação para o coração foi aumentada, foi introduzido o diurético novamente, além do antibiótico para tratar da gripe. O raio X foi feito e não apresentou sinais de pneumonia, graças a Deus. Ficamos aguardando o ecocardiograma que só poderia ser feito na semana. Começou a rolar um buxixo que já seria a hora da cirurgia corretiva. Meu coração doía só de pensar... Mas eu achava que não ia chegar a tanto. Apesar dela haver descompensado, pedia a Deus que fosse somente isso, que não precisasse ir para a mesa de cirurgia. Quatro dias após a internação foram feitas a ecografia do abdomem e o ecocardiograma, que deram normais. Apesar do ecocardio não estar maravilhoso se enquadrava nos parâmetros do último ecocardio. A ecografia do abdômem também mostrou que estava tudo de volta aos seus devidos lugares, o fígado havia desinchado, sinal que a desconpensação havia sido resolvida. Comecei a pedir a todo médico de plantão que nos deixasse ir para casa pois lá temos quase tudo que tem em um hospital. Temos o O2, a técnica, nebulizador, aspirador. Além disso em nenhum momento foi necessária a colocação de acesso venoso, toda a medicação estava sendo feita via gastro, apenas um remédio era um jato para ser respirado e isso a gente podia fazer em casa. Novo exame de sangue foi colhido e não apresentou sinal de infecção, o PCR estava normal. Recebemos a alta. Liguei para a empresa de Home Care e solicitei a UTI móvel para nos deslocar, disseram que o contrato vigente havia caído e que precisariam fazer nova cotação junto ao convênio médico, enquanto isso aguardaríamos internados. No fim da tarde uma enfermeira veio para pegar os dados para a nova cotação e garantiu que ainda naquele dia iria passar ao Home Care. No dia seguinte liguei para o convênio e nada de proposta ainda. A empresa do Home Care informou que o sistema tinha passado a manhã fora do ar mas que ainda naquele dia iria passar a proposta. No dia seguinte liguei novamente no convênio e nada! Ah eu fiquei nervosa... Eu, doida para ir para casa, já com a alta dada pela equipe médica e o home care nos enrolando... Liguei, briguei, o Junior ligou para a coordenadora do home care, até a médica do convênio ligou para o hospital para saber o motivo pelo qual ainda estávamos lá. Foi quando descobrimos que o contrato nunca havia sido interrompido, a empresa do home care é que se confundiu. Afinal marcamos a remoção para o dia seguinte, uma sexta feira, no fim da tarde. Que sensação maravilhosa estar de volta à nossa casa. Depois de sete dias no hospital finalmente fomos para casa. Até Valentina ficou mais disposta, mais feliz, em estar de volta ao seu quartinho, ao seu berço, brincar com seus brinquedinhos. Ainda se passaram alguns dias de dependência de O2 mas o fisioterapeuta, com muita paciência, consegiu o desmame. Até a levamos a uma consulta com o cardiologista usando o O2, foi quase uma operação de guerra mas deu tudo certo. Ele diminuiu toda a medicação e pediu o retorno em um mês para nova avaliação. Mas nos garantiu que ela está ótima, que não precisamos nos preocupar com o seu coraçãozinho que está lindo como sempre.

domingo, 10 de janeiro de 2010

História - Parte IV - Primeiros dias de UTINeonatal







No dia seguinte ao parto, depois de descansarmos e aguardarmos o horário de visitas, fomos ver nossa filha. Descemos à UTINeo e encontramos nossa pequenininha, tão frágil mas tão lutadora! Um dos médicos da equipe nos chamou e falou da possibilidade da Síndrome de Edwards, eles já desconfiavam mas é necessário um cariótipo para a confirmação. Ficamos o restante do horário de visitas com ela e, quando acabou, voltamos para o quarto do hospital. Na parte da tarde a visitamos novamente e à noite nós é que recebemos visitas. Os vovôs, de ambos os lados, foram nos ver, pena que não puderam vê-la pois não tem horário de visitas à noite. Quase fizemos uma festa, de tanta gente que tinha no quarto. No dia seguinte nova visita pela manhã e recebi alta. Um momento muito complicado para nós, sair do hospital sem ter nosso bebê no colo. Olhávamos outras pessoas que também estavam indo para casa com seus filhotes e o nosso ficando lá. Mas fomos à ação. Fomos ao cartório para fazer o registro de nascimento, Valentina já era uma pessoa perante a sociedade. Fui ao meu trabalho entregar a certidão para inclusão no plano de saúde, não queria nenhum surpresa negativa neste departamento, principalmente por não sabermos por quanto tempo ela ficaria hospitalizada. Chegamos em casa e tivemos outro momento bastante complicado, ver o seu quartinho arrumado e não tê-la para usufruir de tudo que fizemos. Dá uma sensação de vazio tão grande... Os dias seguintes foram uma rotina inabalável: acordávamos, íamos para o hospital, almoçávamos, voltávamos para o hospital e íamos para casa esperar o próximo dia. Nos sentíamos em um vácuo no tempo, sem nada a fazer a não ser ir e voltar do hospital, sem perspectiva de alta, nada nos alegrava, nada nos chamava a atenção. Íamos para casa e não tínhamos quase nada a conversar a não ser o estado da Valentina naquele dia, a medicação que estava sendo utilizada e outros assuntos sobre o mesmo tópico. Eu lia compulsivamente e o Junior virava noites pesquisando na internet as drogas, os tratamentos usados. Ele discutia com a equipe médica quase como se fosse um deles, entendia as mudanças da medicação, em que elas iriam afetar e até sugeria novos procedimentos. Várias vezes os médicos ficavam chateados, fugiam dele, os outros pais perguntavam se ele era profissional de saúde. Eu me concentrava somente em conversar com Valentina, dar amor e carinho. Nesse meio tempo, foi feito um ecocardio e o CIV dela finalmente foi quantificado, uma comunicação ampla de 0,9cm, que necessitaria de intervenção cirúrgica ainda sem data marcada. Também foram feitos outros exames que mostraram não haver nenhuma má formação interna, principalmente seus rins são perfeitos. Esta é uma das características mais marcantes da síndrome de Edwards: uma má formação chamada de rim em ferradura, uma membrana que liga os dois rins. Basicamente deveríamos aguardar ela ganhar peso para ir para casa. Mas ninguém nos avisou da iminência de uma cirurgia cardíaca paleativa chamada bandagem ou cerclagem da artéria pulmonar. Com o passar dos dias fomos percebendo que a sua capacidade respiratória ia caindo. Ela começou a ficar ofegante, com quedas de saturação, depois começou a dependência de oxigênio, o que era somente um cheirinho foi aumentanto, aumentando até que fomos proibidos de pegá-la no colo pois ela não aguentava ficar sem O2. Foi então que a equipe da cardiologia decidiu pela cirurgia, que foi marcada para o dia 23/12 às 10:00 da manhã.

domingo, 3 de janeiro de 2010

História - Parte III - O parto






Um dia que começou de forma tranquila mas que mudou o resto de nossas vidas. Assim foi 12/11/208. Acordamos cedo para a consulta semanal com o Dr. Fábio, o obstetra. Eu não estava sentindo nada de diferente mas olho de médico é outra coisa. Logo ele percebeu que eu estava com contrações. Eu já tava acostumada com contrações, no fim da gravidez a gente sempre tem um monte, nem tava preocupada pois não estava doendo mas ele resolveu verificar o espaço entre elas, em dez minutos tive três e ele falou que eu já estava entrando em trabalho de parto. Como íamos fazer cesárea mesmo não tinha motivo para esperar o trabalho de parto adiantar mais e já saí do consultório com a guia de internação e horário marcado para as duas da tarde. Fomos dar entrada na internação e eu não tinha levado nada!!! Saimos de casa para uma consulta e não para o parto! Perguntei ao recepcionista quanto tempo para a liberação do convênio e ele informou que era mais ou menos quarenta minutos, voamos para casa pegar as malas e avisar a quem deveria ser avisado. O Júnior ficou hiper nervoso, não parava de andar de um lado para o outro e eu, calmíssima, arrumando as roupas para nossa estada no hospital. Voltamos e ainda nada do convênio liberar, fiquei na recepção do hospital enquanto o Júnior ia almoçar e encontrei o primo dele, o Anderson. Conversamos e ele ficou mais nervoso que eu quando soube que ia parir naquele dia. Depois de muita espera o convênio liberou, o hospital preparou o quarto e subimos. Já estava em cima da hora marcada. Logo apareceu uma enfermeira que me pediu para trocar de roupa e me colocou na maca para irmos ao Centro Obstétrico. Ainda fiquei um tempo esperando os médicos chegarem para começarmos os trabalhos. Quando foi para dar a anestesia sofri um pouquinho pois o médico não acertava de jeito nenhum, me picou umas seis ou sete vezes até que a dra Raquel, que acompanhava o parto, pediu para trocar um pouco de posição e deu certo. Deitei e fiquei conversando com o Júnior, dizendo que tava sentindo a minha perna, que a anestesia não tava fazendo efeito e ele rindo de mim, pois a essa altura a Valentina já tava quase nascendo. Passado alguns minutos o dr. Fábio me disse para segurar a barra pois eu estava com muito líquido amniótico e ia ser um pouco mais difícil, já que ela era muito pequena e iam fazer pressão para empurrá-la para baixo. A assistente começou a apertar a minha barriga para baixo e o dr teve que ir buscar Valentina lá dentro já que ela não queria sair. Foram alguns segundos e ele disse pro Junior ir tirar fotos que ela tava nascendo. Não esqueço a dra. Raquel dizendo que ela era um toquinha, o que foi particularmente estranho e engraçado pois o apelido do Junior quando era criança era Toco. Eu só ví o Junior levantando e saindo correndo atrás da cria, brinquei com o dr. Fábio dizendo que tinha acabado de ganhar uma filha e perdido o marido. Mais alguns segundos e ouvi o seu choro forte pela primeira vez, ela estava sendo avaliada pelo pediatra. Nesta avaliação o pediatra avisou ao Júnior que ela tinha quatro estigmas: o CIV, implantação baixa das orelhas, fenda única na mão e a posição dos mamilos um pouco mais baixa e separada. Disse que ela não tinha síndrome de Down mas que seriam necessários outros exames para um diagnóstico. O Júnior voltou com os olhos brilhando, dizendo que ela era linda, pequenininha e bem brabinha. Mais um pouquinho e a enfermeira a trouxe para eu ver, que coisa mais linda! Conversei um pouquinho com ela, dei beijinhos e a levaram para a encubadora. Depois de terminada a cirurgia fui para a sala de recuperação esperar a anestesia passar. Dormi e, quando acordei, já era hora de irmos pro quarto. No começo da noite ligamos na UTI Neonatal para ter notícias e disseram que ela estava bem. Como só poderíamos vê-la no dia seguinte, no horário de visitas, nos concentramos em minha recuperação com bastante descanso para nós dois, que estávamos muito cansados.